As discussões iniciais do 29º Congresso Internacional da Indústria do Trigo, evento promovido pela Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), abordaram a desestatização, além do crescimento da produção do cereal no Brasil e como isso contribui para a garantia da segurança alimentar.
O evento que teve início na noite do domingo (25) e segue até esta terça-feira (27), em Foz do Iguaçu, no Oeste do Paraná. “O trigo é um desafio para o qual o Brasil se posiciona cada vez mais como um player diferenciado. Quando olhamos para as empresas que apoiam eventos como este, percebemos como elas fortalecem o dinamismo do setor. Precisamos continuar atraindo investimentos com o compromisso de fornecer para o mundo alimentos, equipamentos e serviços”, destacou o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Paulo Alvim.
Abrindo a programação de conteúdo, a palestra inaugural do congresso transmitiu um panorama do cenário político e econômico aos participantes do evento. O cientista político e professor do Insper, Fernando Schuler, pontuou a desestatização como caminho para o futuro da política nacional.
“Vivemos um momento de grande instabilidade no campo político brasileiro. Ao mesmo tempo, passamos por uma revolução tecnológica, que abalou ainda mais a democracia e o debate público. Isso trouxe à luz a discussão do inchaço do Estado, sendo a desestatização e especialização da esfera governamental uma solução para reduzir a burocracia dos processos e atrair novos investimentos ao País”, explicou Schuler.
O presidente-executivo da Abitrigo, Rubens Barbosa, ecoou esse ponto de vista, reforçando o papel do setor empresarial para o desenvolvimento não apenas do setor do trigo, mas do Brasil como um todo. “A democracia está consolidada, mas ainda falta mais influência do setor privado para o seu pleno exercício. Nesse sentido, ele deve ser ativo, levando para frente sua agenda de interesse e contribuindo para o avanço nacional, tanto na política quanto na economia”, reforçou Barbosa.
Potencial do Brasil para produção de trigo
A abertura oficial da 29ª edição do congresso, na manhã desta segunda-feira (26), seguiu com o debate sobre a aptidão do Brasil na produção de trigo e as projeções de crescimento de safra para os próximos anos, com o alcance da autossuficiência e até mesmo o posicionamento do país como exportador do grão, na próxima década.
O presidente do Conselho Deliberativo da Abitrigo, Rogério Tondo, apontou as conexões que proporcionam oportunidades de aprendizado e relacionamento que, segundo ele, impactam positivamente no aproveitamento de oportunidades e nas decisões dos negócios.
“Sobretudo diante do quadro de volatilidade, incertezas, complexidade e ambiguidades que estamos vivendo, em um ambiente de retomada após o grande pico da pandemia, guerra na Ucrânia, problemas climáticos, eleições, câmbio e de uma supersafra brasileira que se aproxima. Nada melhor do que estarmos conectados, trocando experiências e expectativas”, apontou.
Na sequência, o pesquisador e melhorista do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná, Carlos Roberto Riede, representando o Secretário de Agricultura do Paraná, Norberto Ortigara, destacou a importância do estado para a produção de trigo. “O Paraná é um dos principais produtores do trigo e ressalto que o potencial de área e de produção do cereal no Brasil está em expansão, o que pode levar o País à autossuficiência”, frisou.
O chefe-geral da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski, abordou o papel do desenvolvimento de uma produção de trigo sustentável. “Como um cereal de inverno, o trigo é uma planta descarbonizante. Sua importância vai mais além da produção de pão, biscoito e macarrão, por exemplo”, disse. “O cultivo de trigo melhora a estrutura do solo e temos iniciado uma ‘revolução’, seguindo o mesmo caminho das produções de soja e de milho no Brasil”, destacou.
Segundo ele, o Brasil tem totais condições de produzir todo o trigo para atendimento de sua demanda. “Podemos contribuir com a segurança alimentar e com a cultura da paz. Até 2030, o Brasil supera as 20 milhões de toneladas de trigo. Isso é resultado do trabalho de toda a cadeia do trigo em prol desse crescimento de produção e qualidade.”, ressaltou.
Aumento de produção e segurança alimentar
O coordenador do FGVAgro, Roberto Rodrigues, avaliou o crescimento do mercado do trigo. “O Brasil vai exportar 10 milhões de toneladas de trigo daqui a dez anos. É uma chance que a história coloca no ‘colo’ de vocês”, ressaltou. Sobre o tema segurança alimentar, Rodrigues destacou que não existe estabilidade política nem segurança em um país com fome. “O Brasil pode não só produzir alimento, mas também ensinar o mundo a ‘pescar’, tecnicamente, ensinando a fazer bem feito”, disse.
Segundo ele destacou, o USDA projeta que o mundo deverá aumentar a produção de alimentos para atender o crescimento de demanda até 2026/27. “O Brasil é o país que mais ampliará a produção, com previsão de aumento de 41% no período. Temos terra disponível, tecnologia e gente para produzir”, apontou.
Finalizando o painel, o consultor Pablo Maluenda destacou que, nos últimos dez anos, a União Europeia tem se constituído como maior produtor de trigo entre os grandes exportadores, mas tende a reduzir a sua produção desde o seu pico em 2015, aumentando sua dependência das importações do Mar Negro e dedicando terras a outras culturas.
Segundo ele, além da Rússia, há um aumento na produção também na Ucrânia e Argentina, entre os países que exportam para a América Latina, e queda na produção dos Estados Unidos em dez anos. Maluenda apresentou os fatores que afetaram o mercado do trigo ao longo de 2022.
“Destaco a guerra na Ucrânia, medidas econômicas tomadas nos Estados Unidos que afetam outros países e a economia mundial, o clima, e os reflexos da pandemia, que continuam a ser um fator que afeta os mercados, principalmente, considerando a situação na China e, ainda, uma possível recessão global como resultado”, afirmou.
Na visão dele, a forma como a situação na Ucrânia está evoluindo é um ponto importante de preocupação. “A expansão da guerra, exportação de grãos e a produção na área da Ucrânia é motivo de apreensão. A Rússia continuará tendo problemas para encontrar acordos de exportação para o seu trigo. No final de setembro, as exportações de trigo estão estimadas em menos de 8 milhões de toneladas, cerca de 3 milhões a menos do que há um ano”, finalizou.