Na manhã desta quarta-feira (20 de novembro), Alexandre Bompard, CEO da gigante francesa, anunciou que a rede varejista não comprará mais carnes do Mercosul — aquele bloco sul-americano que inclui Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai e exporta toneladas de proteínas para as mesas europeias.
O comunicado foi direto: a decisão responde às pressões dos agricultores franceses, que estão descontentes com o acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul. Desde o começo da semana, protestos com direito a bloqueios de rodovias e queima de objetos dominam as manchetes francesas. O Carrefour, aparentemente, resolveu se aliar aos tratores parados e à fumaça das barricadas.
A resposta do Cerrado - Do outro lado do Atlântico, Jaime Verruck, secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar do Mato Grosso do Sul, reagiu como quem perde a aposta na última rodada do truco.
“Essa é uma medida lamentável e unilateral, reflexo da pressão de produtores europeus que não têm competitividade frente aos países do Mercosul. Ignora os altos padrões de qualidade, sustentabilidade e boas práticas do Brasil”, declarou.
Verruck, que ocupa um cargo que parece englobar todos os desafios econômicos e ambientais do Centro-Oeste brasileiro, também fez questão de lembrar que a carne brasileira não é apenas uma commodity. É um orgulho nacional, com status de exportação de luxo.
Pressão francesa, churrasco sul-americano - A briga, claro, não é só sobre carne. Agricultores franceses acusam os países do Mercosul de trazerem ao mercado europeu produtos mais baratos e que supostamente não seguem os mesmos padrões ambientais e trabalhistas. Na prática, temem perder espaço para a picanha, o bife de chorizo e a costela.
Mas Verruck não comprou essa narrativa. Segundo ele, a agropecuária brasileira cumpre rigorosos critérios internacionais. “Os produtos brasileiros seguem padrões sanitários e ambientais de excelência. Essa decisão desconsidera os avanços que temos feito na área de sustentabilidade”, enfatizou, como quem explica ao mundo que churrasco brasileiro é patrimônio cultural.
Ministério, associações e a retórica do protecionismo - O Ministério da Agricultura do Brasil e a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) também entraram na discussão. Ambos classificaram a decisão do Carrefour como protecionista. Para a ABPA, a medida é “infundada” e ignora o fato de que os produtos brasileiros atendem plenamente às exigências europeias.
“Estamos falando de carnes que seguem padrões tão rigorosos quanto os europeus, mas com um preço que os produtores franceses não conseguem igualar. Isso não é sobre qualidade; é sobre competitividade”, rebateu uma fonte ligada ao setor, que preferiu não ser identificada.
Entre o veto e o veto - Na França, o presidente Emmanuel Macron enfrenta a pressão dos agricultores para vetar o acordo UE-Mercosul. Já no Brasil, o receio é de que a decisão do Carrefour inspire outras grandes empresas europeias a adotar boicotes similares, aumentando as barreiras comerciais para os produtos sul-americanos.
“Essa postura protecionista enfraquece o espírito de livre comércio e prejudica toda a cadeia produtiva do Mercosul”, reforçou Verruck, que vê no movimento do Carrefour um perigoso precedente.
O cenário se desenrola como um embate de princípios. De um lado, o protecionismo europeu travestido de cuidado ambiental. Do outro, o Mercosul, tentando explicar que a picanha exportada é tão ética quanto saborosa.